segunda-feira, 9 de maio de 2011

[Entrevista] Nilson Lage: A sala de aula do mundo

Via Observatório da Imprensa

Nilson Lage é jornalista e professor titular da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Começou em jornal 45 anos atrás, tem larga experiência de sala de aula e levou para a universidade o compromisso com o rigor factual (e conceitual) típico das melhores redações. É testemunha ocular das transformações da imprensa e jamais foi adepto, na academia ou fora dela, da abstenção ao bom debate. Participa amiúde de encontros, palestras, comissões, seminários, colóquios, conferências e ainda acompanha alunos em graduação e pós-graduação. De certo modo, pode-se dizer que Lage sempre deu a cara a tapa e tem exercido como poucos, e com arguta radicalidade, o exercício da crítica, da polêmica e da reflexão sobre a prática e os rumos do jornalismo no Brasil.

Os cursos de Jornalismo no Brasil sabem preparar os novos profissionais da mídia informativa? Outras perguntas, na mesma: os cursos de Jornalismo são mesmo necessários para formar um jornalista? Por quê?

Nilson Lage – Invertendo as questões: o jornalismo não era profissão de nível superior quando comecei a trabalhar, na década de 50. Havia três categorias de jornalistas: os competentes, que ou escreviam bem ou entendiam de produção gráfica, raramente as duas coisas; os que traziam anúncios ou tinham contatos políticos (entre esses os jovens da elite que não se adaptavam às profissões destinadas à sua classe); e, finalmente, os que faziam o trabalho mais pesado ou menos nobre, como saber o que se passava nas delegacias de polícia ou dar plantão nos hospitais. Os salários, para os jornalistas considerados necessários, costumavam ser complementados por empregos públicos, patrocinados pelas empresas e a que não se tinha de comparecer; os demais eram às vezes remunerados pelas fontes ou podiam arrumar outras receitas – participando, por exemplo, do rateio do dinheiro tomado pela polícia das prostitutas ou dos bicheiros.

É claro que a formação superior elevou o padrão ético, trouxe dignidade ao ofício e permitiu, senão maior brilho nos grandes momentos, pelo menos padrão mínimo de qualidade na produção rotineira. Está certamente relacionada à consciência de classe da categoria, que lutou por ela meio século.

Resta saber se qualquer formação superior serviria, como regra. Não creio. Primeiro, porque é jogar fora tempo e dinheiro. Um médico, entre a faculdade e a residência médica obrigatória, consome sete a oito anos de sua vida; se decidisse ser jornalista, gastaria mais um ou dois, no mínimo, até adquirir, da experiência e por autodidatismo, novos esquemas de pensamento e alguma proficiência – assim mesmo restrita aos impressos, ou ao rádio, ou à televisão, ou à internet. Sua formação básica (como médico) poderia ser útil apenas para uma porcentagem pequena de matérias e lhe traria, por outro lado, impedimentos éticos específicos: por exemplo, ao denunciar a desonestidade de um charlatão diplomado dirigindo-se não aos conselhos regionais de medicina, mas ao público em geral. Mesmo considerando que tal pessoa fosse empregada exclusivamente para cobrir o setor de saúde, e que habilmente se livrasse dos conflitos deontológicos, a maior exatidão técnica de seu texto teria que ser compensada por uma visão social e política que não é enfatizada nos cursos médicos.

Em minha opinião, apesar desse desperdício, deveria ser dada oportunidade de formação de jornalistas em cursos de pós-graduação, desde que contemplados os conteúdos técnicos e treinamento laboratorial. No entanto, nos países onde existe, esse canal de ingresso na profissão é mais procurado por executivos da área de comunicação do que por pessoas que ambicionam o salário de repórter, redator, repórter fotográfico etc.

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