quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

A realidade é a evolução do mercado

Entrevista com José Roberto Whitaker Penteado para revista Propaganda a.54 n.705 dezembro 2009
Por Pedro Yves

 



José Roberto Whitaker Penteado é um dos mais conhecidos e respeitados profissionais de marketing do Brasil. Foi diretor do primeiro curso regular de marketing no Brasil, criado pela Fundação Brasileira de Marketing, em São Paulo. Exerceu funções executivas em empresas brasileiras e multinacionais. Profissional versátil, é também jornalista, sendo colaborador de diversas publicações, e ainda professor, conferencista, consultor de empresas, escritor e poeta. Recentemente, com a morte do publicitário Luiz Celso de Piratininga, assumiu o cargo de presidente da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), instituição à qual está ligado há mais de três décadas e da qual é membro do conselho superior. Como executivo, iniciou sua carreira em marketing na Nestlé, nos Estados Unidos. No Brasil, trabalhou na Refinações de Milho Brasil; Reckitt & Colman; Editora Abril; Almap/BBDO e L'Oréal. Tem sido um defensor constante da correta aplicação das técnicas e métodos de marketing à realidade econômica e cultural do Brasil. Sua formação acadêmica inclui graduações em economia e pedagogia, mestrado em ciências políticas (IUPERJ) e doutorado em comunicação e cultura (ECO/UFRJ), com a tese "Os Filhos de Lobato". Foi aluno do Instituto Carlos A. Werneck, de Petrópolis. Tem oito livros publicados. Foi também o redator e coordenador do Código de Ética do Profissional de Marketing do Brasil. Nesta entrevista, ele fala de seus projetos à frente da ESPM e destaca a preocupação em manter a escola atenta à evolução do mercado da comunicação.

O sr. assumiu a presidência da ESPM devido a uma tragédia, que foi a morte inesperada do professor Luiz Celso de Piratininga. Isso, de algum modo, inibe possíveis mudanças na escola que o sr. queira fazer?

Não. O Pira (era assim que Luiz Celso de Piratininga era conhecido pelos mais próximos) foi meu companheiro de ESPM por mais de 40 anos. Começamos juntos na antiga sede da Rua 7 de Abril, no mesmo prédio do Masp (Museu de Arte de São Paulo). Somos da primeira geração da escola; ele, eu, o Mario Chamie, o Otto Scherb, o Francisco Gracioso. Eu, de fato, fui o primeiro a optar por trabalhar só na escola. Isso foi há mais de 30 anos. Por isso, acompanhei sempre de muito perto as mudanças na escola, primeiro aquelas que o professor Gracioso fez. Ele mudou muito a escola e a fez crescer. Depois, veio o Pira, que teve um tempo curto, mas mesmo assim fez um bom trabalho, principalmente nas áreas financeira e administrativa.

Então o sr. pegou a ESPM num momento tranquilo?

Olha, posso dizer que tomei um susto quando soube da responsabilidade. Senti-me como naquele filme “Apertem os Cintos que o Piloto Sumiu”. Mas, felizmente, pude contar com uma tripulação altamente competente, que herdei de uma gestão bem-sucedida.

Quais projetos o sr. pretende implementar na escola?

Quando eu trabalhava como consultor de marketing, era comum um cliente chegar reclamando que sua empresa estava em situação desesperadora ou até insolúvel. Então eu dizia que o que ele precisava em primeiro lugar não era de marketing, mas de banco, porque marketing se faz quando a empresa está bem. Fazendo analogia com a minha situação atual, a ESPM está bem, tem fundos e fluxo de caixa saudável. Por isso poderemos realizar projetos importantes.

E quais são eles?

Em 2010 elaboraremos o plano quinquenal da escola. É por meio dele que traçamos os rumos estratégicos da escola. Nós somos uma escola de ciências humanas com ênfase em comunicação. As áreas na qual atuamos, por exemplo administração, estão todas centradas na comunicação, porque o mundo é cada vez mais voltado à comunicação, que por sua vez está sofrendo transformações rápidas e violentas. Veja o que a tecnologia traz de novidades a cada dia. É difícil acompanhar todas as mudanças e novidades. Por isso, digo que qualquer disciplina centrada em comunicação pode atuar de alguma forma nas mais diversas áreas. Temos uma consultoria, a Kaiser, trabalhando junto com o grupo diretivo da escola na elaboração do plano quinquenal. Acredito que até junho do ano que vem teremos as diretivas prontas.

O que dá para adiantar de novidades que constarão do plano quinquenal? Por exemplo, será finalmente aberto o campus de Brasília?

A expansão geográfica não é prioridade num primeiro momento. Em Brasília por enquanto manteremos os cursos que ministramos em convênio com outras instituições. Abrir o campus de Brasília não tem data marcada ainda. O que importa nesse momento é a expansão centrada na diversificação de cursos. Nosso objetivo em curto prazo, na verdade, é nos tornarmos um centro universitário para depois chegarmos à universidade.


Quais são os passos para isso?

O próximo curso que iremos implantar será jornalismo. Nesse sentido, já mantemos intercâmbio com três grandes escolas de jornalismo dos Estados Unidos: Colúmbia, de Nova York; Medell, de Chicago; e Berkeley, que fica na Califórnia. Vamos começar com pós-graduação; em seguida, implantaremos a graduação. Outro curso que pretendemos oferecer em breve será de ciências sociais, mas com um diferencial em relação aos que temos no Brasil. Hoje em dia, a ciência social ficou aprisionada ao campo teórico da sociologia, representada principalmente por nomes como Durkhein, Weber e Marx. Em vez de examinar a sociedade como ela é e desenvolver métodos de ação baseados na realidade presente, as ciências sociais ficaram atreladas às teorizações, muitas vezes, sem efeito prático. Na ESPM as ciências sociais serão centradas no comportamento humano. Para isso, buscaremos subsídios de outros campos do conhecimento, como psicologia e medicina, na área de neurologia. Veja bem, isso não quer dizer que teremos uma faculdade de medicina tão cedo (risos).

Como está a ESPM hoje?

Acabamos de implantar o mestrado em gestão internacional. Em breve, teremos também doutorado. Temos atualmente 262 cursos, distribuídos entre graduação, mestrado e extensão. Nossas três unidades, São Paulo, Porto Alegre e Rio de Janeiro, oferecem hoje quatro graduações cada uma. Temos, portanto, um total de 12 escolas. Iremos aumentar essa oferta de cursos para, num prazo que calculo entre dois e três anos, nos tornarmos um centro universitário e, acredito, em cinco anos, uma universidade. Atualmente, temos cerca de 10 mil alunos e... professores. É importante ressaltar que existe dentro da ESPM uma academia de professores, na qual todo profissional, antes de começar a dar aula, passa por um treinamento de seis meses. Além disso, essa academia também tem o objetivo de aprimorar os professores, incentivando e dando condições para reciclagem e atualização do conhecimento. Aliás, dentro da política de valorizar o corpo docente , estamos investindo para que cada vez mais professores possam dar dedicação em tempo integral à escola.

Existe alguma área de ensino que passará por grandes mudanças?

No IV Congresso Brasileiro de Propaganda, no ano passado, no qual fomos relatores da comissão de comunicação, foi ressaltado nas conclusões que a propaganda é um mercado em enorme expansão e diversificação. Hoje, ele apresenta uma realidade completamente diferente daquela dos tempos das agências tradicionais, porque a propaganda está não só nas agências, mas nos eventos, nas diversas modalidades do marketing, na mídia, nas redes sociais, na comunicação interativa. É uma atividade que não para de se expandir para as mais diversas áreas da atividade humana. Eu disse na ocasião que a ESPM tem a preocupação de acompanhar essa evolução. Fiz esse aparte para contestar publicitários que lamentavam o fechamento cada vez maior de agências, como se isso fosse fruto de uma crise alheia ao meio. Ressaltei que o que está acabando é o modelo anacrônico de agência, mas que novas oportunidades, como nunca houve antes, estavam surgindo para as novas gerações de publicitários. Quis deixar claro que a evolução se acelerou não só na propaganda, mas na comunicação como um todo e que não adianta ficar chorando sobre o passado, mesmo que recente. A tecnologia hoje, muitas vezes, torna anacrônico o que era novidade há menos de cinco anos. Quem souber acompanhar essa evolução terá um leque de oportunidades como nunca antes houve em nossa profissão. A ESPM está atenta para essa realidade.