terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Clima de crise alimenta desconfiança de marcas famosas

Por José Roberto Martins para GlobalBrands

Há pouco tempo a Sadia comemorava ser a marca de alimentos mais valiosa do Brasil, isso segundo algumas listas muito divulgadas. Quando a crise do subprime revelou que a empresa havia especulado com a taxa do dólar, e com isso tivesse pulverizado dos bolsos dos seus acionistas a bagatela de setecentos e sessenta milhões de reais[i], tudo o que se viu de reação da Sadia foram as providências protocolares junto a autoridade mobiliária. Estas, como se sabe, raramente atingem os ouvidos do grande público.

Outras grandes empresas, incluindo os bancos, podem ter feito apostas semelhantes. Afinal, em tempos de cobrança irracional para se obter lucros no curtíssimo prazo, é de se esperar que muitos executivos acabem não resistindo às tentações e façam apostas ousadas, tudo para não comprometer o atingimento das metas comprometidas e assegurar os bônus.

O mercado não sabe quais empresas oferecem maior risco, mas sabe reagir, inclusive quando não tem certeza. Além das perdas próprias e de terceiros, a Sadia viu as suas ações se desvalorizarem em quase 30% quando a notícia do prejuízo chegou ao mercado.

Nessas circunstâncias a reputação e credibilidade da marca são julgadas. Não importa que seja a Sadia ou qualquer outra marca conhecida. Se a empresa não se comunica adequadamente, os prejuízos vão sempre além dos custos de um trabalho bem feito. Há bem pouco tempo, outra marca celebrada como valiosa nas listas de valor hipotético também pisou na bola.

Quando o carro modelo Fox foi flagrado decepando dedos dos seus consumidores, a primeira reação da VW foi negar o risco e protelar o quando pôde o recall do modelo.Faltaram todos os acessórios e opcionais nesse incidente, inclusive o bom senso dos executivos da marca.

O surpreendente é que existem recursos muito bons para se fazer comunicação, seja em tempos de bonança ou de crise. No caso, a Sadia poderia ter utilizado seus recursos de RP e organizado uma série de eventos, explicando a todos os seus públicos as suas razões e providências. Teria sido mais inteligente. Faria, assim, o que se esperava da Sadia.

Muitas empresas são ótimas para comunicar coisas fúteis, mas são em geral muito fracas para comunicar em situações críticas. Elas vêem apenas os custos e riscos, mas se esquecem que existem oportunidades.
Certas empresas, quando são surpreendidas pelas crises, apelam para o uso de uma comunicação protocolar. Conforme o tipo de incidente empresta-se uma voz de trovão ou de brisa, a qual lerá uma nota que ficará rolando na tela da TV. Em outras circunstâncias, publicam notas nos jornais e revistas, e mal se ocupam de apontar um porta-voz, o qual emprestaria maior credibilidade ao conteúdo informado.

Recentemente, e agora distante dos picaretas do subprime, a Mantecorp, indústria de medicamentos que recentemente desfez composição societária com a Schering-Plough, esteve envolvida, junto com outros laboratórios, em escândalo de venda fraudulenta de medicamentos através dos recursos do SUS.[iv]

A marca fez grande estardalhaço na comunicação do seu lançamento, inclusive emprestando a credibilidade da atriz Fernanda Montenegro. Na ocorrência do escândalo envolvendo alguns dos seus executivos, o que não se viu foi estardalhaço pelo menos igual ao lançamento, justamente quando a marca mais precisava disso.
O que está acontecendo nesse momento oferece uma grande oportunidade de comunicação, tenham ou não as empresas boas coisas a dizer sobre si mesmas. O que não pode é se esconder, surpreender o mercado com notícias graves e fingir que ninguém está percebendo.

Uma forma de entender o que muitas empresas fazem é recorrer a uma imagem descrita pelo escritor francês Stendhal, em seu livro A Cartuxa de Parma. Clelia Conti havia prometido a Nossa Senhora que não mais veria o seu amante Fabrice, e, para não descumprir a promessa, passou a recebê-lo na mais completa escuridão, acreditando que com isso estaria honrando o compromisso assumido.