quarta-feira, 2 de outubro de 2013

[Entrevista] Katsuhiro Harada, o produtor de Tekken

Por Fernando Mucioli para Kotaku

Ele é Katsuhiro Harada, produtor da série Tekken que trabalha na franquia desde que ela nasceu, em 1997, no PlayStation original. Ele esteve no Brasil pela primeira vez, como convidado da BGS 2012, e reservou um tempinho para conversar com o Kotaku por email sobre esse intenso mundo das lutinhas.

Até 2008, a cena de jogos de luta estava em baixa e enfrentando uma seca, mas a série Tekken parece nunca ter sido afetada por isso. Por que você acha que a franquia conseguiu se manter forte? Você acredita que houve um “renascimento” dos jogos de luta depois do lançamento de Street Fighter IV?

O Kotaku é bem analítico, para ser sincero, então talvez o pessoal do Kotaku Brasil entenda bastante de jogos de luta. Como mencionado, especialmente na segunda metade dos anos 90, analisando as unidades vendidas de consoles entre 1997 até o lançamento de Tekken 6 em 2009, ou nos arcades, entre 2004 e 2010, [a série] Tekken bateu um novo recorde como primeiro lugar entre os jogos de luta. Tekken sempre teve muito apoio, enquanto outros jogos de luta se ausentaram, desistiram dos arcades ou não lançaram sequências para os consoles.

Uma das razões para isso é como o jogo é visto entre os próprios jogadores de Tekken. Alguns o vêm como um jogo de torneio, enquanto outros o enxergam mais como um game de ação no qual podem controlar o corpo dos personagens livremente até ver as CGs dos finais. Não importa o caso, sempre criamos o jogo depois de coletar as opiniões dos fãs em vários países do mundo. Acho que os jogos continuaram por tanto tempo por causa disso.

Quanto ao “revival” de Street Fighter, acredito que ele teve um bom impacto nos games de luta. Ele foi bem recebido não só pelos jogadores que costumavam gostar da série, mas também por jogadores mais jovens. Entretanto, gostaria de ver jogos de luta sendo feitos por uma produtora fora do Japão. Não vemos esse tipo de movimento ultimamente, apesar de existirem alguns jogos de luta 2D bem limitados. Não há jogos no gênero da luta 3D. Isso é uma pena.



O quão importante é trazer novos jogadores não só para Tekken, mas para os jogos de luta como um todo? Qual você acha que é a melhor maneira de fazer isso: simplificando as mecânicas ou explicando melhor as que já existem?

Esse é um problema difícil. Eu acredito que jogos com mecânicas simplificadas também sejam necessários. Porém, só ter as mecânicas mais simples resulta em jogos que ficam chatos com facilidade. A teoria ideal é um fluxo no qual o os novos jogos de luta vão substituindo os atuais mas, na realidade, as coisas não são tão fáceis assim.

Então começa-se a discutir se os tutoriais vão dar conta, mas há muitos tutoriais tão chatos quanto aulas no colégio. Por isso adicionamos um novo modo chamado “Fight Lab” em Tekken Tag Tournament 2. Ele é estruturado em cima de uma história única e, ao completar vários minigames, os jogadores podem ir aprendendo os controles e estratégias básicas naturalmente.

Esse modo foi bem recebido e estou pensando em expandi-lo no futuro. Entretanto, o número de novos jogadores não vai necessariamente crescer muito se pararmos aí. Acho que existe um jeito melhor.

Em termos práticos, é mais importante desenvolver uma comunidade ou eventos que combinem com cada país ou território mais do que ter lutas “sérias”, como as de um torneio profissional. Para esse tipo de jogo, no qual é divertido alcançar um nível alto de técnica, é mais importante que ele tenha um bom apoio e faça muito barulho. Não dá para resolver o problema só com uma estrutura digital.



Você e sua equipe já estão trabalhando no próximo projeto, seja lá o que vier depois de Tekken Tag Tournament 2? Por quanto tempo vocês planejam dar suporte a esse jogo, oferecendo novo conteúdo?

Por enquanto estou me esforçando para dar suporte e manter Tekken Tag Tournament 2 atualizado. Mas na minha cabeça, já vou pensando no próximo projeto enquanto olho o feedback e recepção de Tekken Tag Tournament 2. Na verdade, eu não cuido só de Tekken, então estamos pensando em um novo tipo de jogo, um pouco diferente.



Como você vê o estado atual da cena de jogos de luta? Existe algo que precise mudar? Você acha que serviços como o World Tekken Federation é um passo em direção a esse futuro?

O World Tekken Federation é um passo, mas é um passo para os jogadores “hardcore”. Na minha concepção, eu acredito que devamos evoluir os jogos de luta tradicionais na direção para onde eles estão indo atualmente, ao mesmo tempo em que criamos outro caminho para o gênero. Além de seguir o legado, acredito que é necessário dar um acesso aos jogdores da nova geração.



O Yoshinori Ono, da Capcom, mencionou várias vezes como o trabalho de produtor pode ser estressante. Como você lida com esse aspecto no trabalho?

É verdade, o Ono-san menciona bastante para a mídia “como o trabalho de produtor é difícil”. Ele foi até parar no hospital logo quando voltou pra casa depois de uma viagem de trabalho comigo.

Mas deixa eu contar um dos segredos deles. Mentalmente, ele é um ser humano forte. Forte de uma maneira em que você nem consegue imaginar usando o senso comum. Ele parece que age emocionalmente, mas não é assim; ele é uma pessoa que calcula tudo de uma maneira bem calma, mesmo que as coisas estejam meio difíceis na empresa, ou que ele esteja sendo xingado por várias pessoas na internet. O Ono-san não se comove.

Falta de educação, fofocas e intrigas de trabalho não funcionam com ele. Para te dizer a verdade, a quantidade de stress que vem do trabalho é a menor. Mesmo que ele diga que está estressado, o que ele chama de stress no trabalho não é um milésimo do stress de um humano normal. Mas quando ficam sabendo disso na empresa, dizem pra ele trabalhar mais, certo? É por isso que ele fica fingindo que está estressado! Ser resistente assim ao stress é algo muito raro na nossa indústria.

Yoshinori Ono, Hiroshi Matsuyama (CyberConnect 2) e Tomonobu Itagaki (Valhalla Games, ex-Team Ninja) – para essas três pessoas, não existe stress no trabalho! Esses caras ficam falando: “O Harada é louco! O Harada é louco!” para a mídia e os fãs, mas na verdade é o contrário. Esses três são loucos MESMO. Eles não se importam com nada além do trabalho. Eles vão falar só de trabalho até os últimos minutos antes de o mundo ser destruído por um meteorito caído do espaço. Eles são muito doidos. Mesmo se alienígenas ou o Exterminador invadir o mundo, não importa para eles. É quando eles não trabalham que eles ficam estressados. Esse é um fato que só eu sei: eles são loucos varridos!

Falar desse tipo de coisa com as pessoas é o melhor jeito de me libertar do stress. Ah, é muito divertido falar com as pessoas. Enquanto houver uma garrafa de tequila e um bom jogo de luta, eu nunca vou me estressar.