segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

[Entrevista] O poder de compra das mulheres

Entrevista concedida à Revista Vida & Arte.



Revista Vida e Arte: Como o retrato dessa nova consumidora foi construído?

Mario Persona: A mulher é hoje o alvo mais importante da indústria dirigida ao consumidor final. Além de aproximadamente metade dos lares brasileiros serem hoje dirigidos por mulheres, em todas as situações elas têm um enorme poder de decisão na compra. Por sua própria natureza, as mulheres são também grandes compradoras por causa de sua capacidade de atenção pulverizada. Enquanto o homem é focado e provavelmente sai para comprar como quem sai para caçar -- tendo um alvo só em mente --, a mulher tem um comportamento mais extrativista, mais de coleta, o que a leva a sair em busca de muitas coisas por ter também um espectro maior de interesses, como beleza, saúde, casa, filhos e até as necessidades do marido. São poucos os homens que compram para suprir necessidades da mulher, mas são muitas as mulheres que compram para suprir necessidades do homem. Daí seu extraordinário poder de compra e consumo.

Revista Vida e Arte: Como é o perfil dessa mulher que mais do que preocupada em 'gastar' está querendo obter o melhor custo-benefício dos produtos que adquire?

Mario Persona: As mulheres são habilidosas em transformar limão em limonada, ovos em omeletes e um objeto qualquer em peça de arte e decoração. Por isso ela não analisa apenas o uso imediato daquilo que compra, mas tem uma visão muito mais holística dos desdobramentos daquela compra. Ela também pensa em mais pessoas que poderão ser beneficiadas pela sua compra e inclua aí até mesmo produtos como roupas e cosméticos. A mulher se veste bem para causar um impacto positivo no ambiente como um todo, enquanto o homem pensa muito mais no conforto pessoal. Por isso, de um modo geral, a mulher é sempre mais preocupada com as conseqüências de uma compra, e isso inclui a melhor relação custo-benefício.

Revista Vida e Arte: Podemos dizer que hoje as mulheres ditam regras de consumo? Por que?

Mario Persona: Sim, porque até mesmo a indústria automobilística e de produtos eletro-eletrônicos acompanha os grandes desfiles de moda para saber quais serão as tendências de cores para o ano seguinte. Essas tendências no vestir têm um grande impacto na escolha das cores dos carros e eletro-eletrônicos porque elas traduzem o gosto estético da população, ou pelo menos o que será "vendido" como gosto estético durante algum tempo.

Questões como usabilidade têm também hoje uma grande influência do público feminino, menos curioso do que o homem para aprender como as coisas funcionam, e mais voltado para a simplicidade e resultados imediatos de sua utilização. Embora algo complexo possa atrair o público masculino, mais ligado em desafios e com um cérebro que gosta de montar e desmontar as coisas, são as coisas simples que atraem as mulheres, porque o objetivo delas não está na coisa em si -- seja o objeto ou produto -- mas nos benefícios que trará.

Revista Vida e Arte: O mercado (em geral) está totalmente preparado para atender as exigências destas mulheres?

Mario Persona: Nem sempre, porque muitas empresas são predominantemente masculinas. O homem não tem a sensibilidade necessária para entender a alma feminina e precisa do auxílio das mulheres para poder enxergar o que uma mulher deseja comprar. Mesmo assim, acho que nunca será capaz de enxergar com a clareza que uma mulher enxerga.

Revista Vida e Arte: A comunicação das marcas acompanhou (ou acompanha) o ritmo de evolução dessas consumidoras ao longo dos anos?

Mario Persona: Sim, e creio até que a comunicação possa caminhar um passo à frente da produção industrial, já que é muito mais rápido desenvolver um diálogo de uma marca ou produto com seu público alvo do que desenvolver o próprio produto. O mundo da comunicação é também mais feminino do que o mundo do design e desenvolvimento de produtos, o que permite aos profissionais de marketing e áreas correlatas terem uma visão melhor do que pensam as consumidoras. É por isso que cada vez mais a indústria de bens de consumo procura trabalhar integrando suas áreas de desenvolvimento de produtos com o marketing, a comunicação e o pessoal de vendas, que é quem tem um contato maior com os elos finais da cadeia produtiva.

Fonte: Mário Persona